sábado, 8 de junho de 2013

Sobre o Estatuto do Nascituro




Para as pessoas que ainda insistem neste mito estúpido do "instinto materno", como se toda mãe devesse amar seus filhos, independente de tudo. Fica aqui uma dica incrível: não, nem toda mãe ama seu filho. Ou você vai me dizer que nunca ouviu falar em mães que abandonam os filhos, em mães negligentes, ausentes, ou em mães que até mesmo  atiram o filho pela janela. Isso não é mero desequilíbrio mental. Isso se chama gravidez indesejada levada ao extremo.

Mães não são ciborgues projetados para amar incondicionalmente. Mães são seres humanos, com todas as complexidades, todos os dilemas e todas as inseguranças que qualquer pessoa carrega. Quando uma mulher dá a luz, imagino, não ocorre um fenômeno mágico que a transforma imediatamente numa criatura santa e sobrenatural, e não há nada de glamoroso e fantástico na gravidez. Acha que eu estou mentindo? Então experimente engravidar.

Tendo dito isso, gostaria que imaginassem, então, uma mulher que carrega em seu ventre um feto fruto de um abuso sexual. Além de ser uma gravidez indesejada, é uma lembrança viva de uma violência, de um homem que, brutalmente, a violentou, invadiu dolorosamente a sua intimidade, a humilhou, subjugou, feriu de todas as formas possíveis.

O que eu consigo visualizar desta situação é uma mulher despreparada, humilhada e abandonada, sendo obrigada a alimentar em seu âmago um ser que a recordará todos os dias de uma violência, a qual, por si só, já teria sido suficiente para marcar sua vida para sempre. Eu só consigo imaginar uma mulher que definha e morre por dentro, enquanto um ser vai ganhando forças as suas custas. As custas do sofrimento dela.

O que eu consigo visualizar é uma criança rejeitada por uma mãe confusa que não consegue amá-la por completo. Uma criança complexada, magoada, que, ao longo da vida, provavelmente irá desejar não ter nascido, porque se sente um fardo e sente uma profunda e incorrigível culpa por ter "arruinado" a vida da própria mãe.

Por favor, pessoas que se opõem ao aborto, se coloquem no lugar dessas mulheres. Dessas mulheres que engravidam violentadas por um homem; que engravidam, mas o bebê possui alguma doença que o impedirá de ter uma vida digna, ou então sequer nascerá vivo; que engravidam por acidente - e não venham me dizer que não ocorre, pois ocorre, porque nenhum método anticoncepcional é 100% seguro - e não possuem nenhuma condição para criar uma pessoa como se deve.

Se coloquem no lugar dessas mulheres que não apenas precisarão passar por uma gestação incômoda, mas terão uma responsabilidade para o resto de suas vidas. Dessas mulheres que abrirão mão de seus sonhos, de seu tempo, de sua energia, de seu dinheiro e de sua autonomia para se dedicar a criação de outro ser humano. Porque, aparentemente, as pessoas esquecem que a questão não se encerra numa sala de parto, no abortar ou não abortar.

Espero que vocês sejam capazes de prever as consequências de crianças nascidas em contextos inoportunos. Espero que consigam se lembrar de todas as crianças miseráveis que moram pelas ruas, de todas as crianças maltratadas, de todas as crianças abandonadas em orfanatos e de todas as crianças assassinadas.

Na minha opinião, é muito mais ""simples"" interromper todo este drama enquanto este ser ainda não nasceu, ao invés de trazer ao mundo mais uma criança desamparada e um futuro adulto desequilibrado, traumatizado e inseguro. Melhor ainda: interromper todo este drama enquanto o ser é ainda um embrião e não sentirá nenhum tipo de dor.

Para mim, obrigar uma mulher a se manter grávida é assinar uma sentença de morte para a mãe e para o ser humano dentro dela. É claro que há sempre a possibilidade de o bebê nascer e ela amar ser mãe, mas e se isso não ocorrer? Se isso não ocorrer, se você é contra o aborto e a favor deste Estatuto, você está sentenciando uma mulher a interromper sua vida e, provavelmente, está sentenciando uma criança a viver pela metade.

Porque defender a vida pela vida para mim não conta. Viver por si só não é a única coisa que importa. É preciso viver com qualidade, num ambiente saudável e positivo. Viver sabendo que é amado, que sua família torce pelo seu sucesso, que terá oportunidades de crescer e se aprimorar.

Ter um filho não é (ou pelo menos não deveria ser) para qualquer um! É para pessoas cuja missão de vida seja criar um indivíduo. É para pessoas que se amam e contam com uma ótima estrutura familiar, psicológica e financeira. É para pessoas interessadas em desenvolver esses laços de mãe/pai e filhx. 

Não é para pessoas vaidosas que gostam da ideia de ter um "mini mim". Não é para pessoas que seguem a boiada e acham que simplesmente "faz parte da vida". Não é para pessoas que sequer conseguem se sustentar. Não é para pessoas que não questionam a si mesmas, nunca consultaram um terapeuta ou nunca buscaram se aprimorar. Não é para casais desfuncionais que acreditam que a salvação está num bebê. Não é para jovens estudantes, nem para velhos frustrados, nem para pessoas entediadas com a própria vida. E definitivamente não é para pessoas que têm filhos para poder pedir esmola na rua ou para garantir um Bolsa Família da vida.

Entendem?

Não é para qualquer um e pronto!

Já existem pessoas sofridas, desamparadas e desequilibradas DEMAIS no mundo, eu tenho certeza de que não precisamos de mais. Então, se uma mulher não possui nenhuma condição de criar um ser humano, então ela precisa de todo o apoio e de todas as condições para interromper sua gravidez com segurança.

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